A tempestade de ontem havia sido negra, feroz como mil
panteras. Como todos os dragões que cospem fogo na terra do faz de conta.
Rasgou as vestes do dia, lavrou o peito, arou sentimentos.
Feriu o inconsciente, o subconsciente, tremulou toda a
estratosfera.
Imensidão... espaço sem fim.
E ela a andar... trôpega, frágil... a andar.
Ontem foi enfim assim, em fim.
E nasceu outra aurora, outro sol, outra claridade. Como se
um raio cortasse o horizonte abrindo um rasgo onde os olhos quase se perdem.
Cavalos brancos.
Vestes brancas.
Mar azul.
Uma estrada sem muros e o susto da liberdade, quase, mas nem
tanto tardia.
Um tropel de anjos pedindo licença para entrar.
Harpas, violinos e um som quase inaudível, um som novo, e um
medo, um medo cego do novo.
O mundo já não era mais o mesmo.
Não existiam mais castelos de areia, nem a ordem mecânica
das coisas.
Algo havia se rompido.
Ela estava nua, despojada de toda a vestimenta que a
encobria até os olhos.
Estava nua e ao mesmo tempo tão pura.
Ela já não era mais ela.
Ela era o mundo.
Lou Witt